quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

OS ATIVISTAS DO DESIGREJAMENTO - Zilton Alencar





Ontem um tema de debate que eu participei foi sobre os chamados (muitas vezes pejorativamente) "desigrejados". Não gosto de usar este termo de forma pejorativa, pois a meu ver é assunto sério! Vivemos uma geração de apostasia, e alguns não encontrando uma Igreja adequada para congregar optam por ficar em casa. Sinceramente, eu acho mais proveitoso ficar em casa assistindo tevê aberta (sic) do que participar de cultos antropocêntricos e egocêntricos, fazer parte do comércio da fé e se alimentar das bolotas que os porcos comem!

Como bem diz o meu amigo Wande Neto, adepto sério e sincero do movimento, "a palavra 'desigrejado' é usada por denominacionalistas para pejorar um movimento serio, o dos adenominacionais". Não duvido. Há muita gente boa e séria embarcando neste movimento. Mas também há os xiitas, geralmente muito xaatos!

Eu entendo a opção de muitos daqueles que são taxados e rotulados como "desigrejados". Na maioria dos casos eles optam por este afastamento por se tornar impossível permanecer congregando na igreja apóstata. Muitas vezes aconselho pessoas a distância, via WhattsApp ou Facebook, e experimento a impotência de tratar com pessoas que moram em pequenas cidades e não ter UMA ÚNICA OPÇÃO de Igreja sadia para encaminhar-lhes para congregar! E O PIOR: até as cidades maiores já sofrem com este problema!! O que fazer? Em alguns casos, nem grupos familiares sérios existem! Aonde estas pessoas irão congregar?? Para onde as encaminho?? São ovelhas que não têm pastor...

Eu, pessoalmente, não suportaria mais congregar em uma "igreja" apóstata, e quando vejo Deus clamando em alta voz “sai dela, povo meu, para que não sejas participante dos seus pecados, e para que não incorras nas suas pragas” (Ap 18:4), entendo que Ele não se refere simplesmente à Igreja Católica (como muitos tradicionalmente interpretam este texto sobre a 'Babilônia', a mãe das prostituições), mas a toda e qualquer "igreja" que apostata da fé. Vejo ainda no mesmo texto que Ele, Deus, se agrada quando os seus abandonam as organizações apóstatas. Posso estar errado, mas é melhor um desigrejado sincero do que um igrejado de igreja apóstata!

Tenho muitos amigos "desigrejados", e muitos deles mais coerentes e mais sinceros que muitos "igrejados" que conheço! Na maioria são pessoas decepcionadas com um sistema corrompido e imoral, com pastores inescrupulosos e gananciosos, com o comércio da fé, com um sistema musical go$pel que canta qualquer porcaria e chamam tais músicas de louvor e adoração, com uma sede insaciável de títulos e cargos eclesiásticos, com um sistema maligno de extorsão financeira que visa enriquecer a "igreja" e seus "pastores". Decepcionam-se e resolvem deixar de fazer parte da farsa. E fazem bem! ISSO NÃO É IGREJA!

Mas há outro grupo: o dos "desigrejados-ativistas"! São os que saem revoltados e resolvem então pregar contra tudo, disparando "suas metralhadoras cheias de mágoas" para todos os lados, atingindo os maus e, de bônus, atingindo também os bons. Enquanto os "desigrejados" são pessoas bem intencionadas, sinceras e equilibradas, os ativistas parecem querer algo mais... E para isso se levantam contra tudo que se chama "igreja", e contra todos que dela fazem parte. O problema maior do fenômeno "desigrejados", portanto, não está nos desigrejados em si, mas sim em alguns da liderança (faço questão de não generalizar, pois também conheço líderes equilibrados), assim como o problema dos movimentos GLBTs não está nos homossexuais (na ampla maioria, pessoas boas e equilibradas), mas em seus ativistas radicais!

O que não entendo, e não posso entender são tais ativistas vociferando contra o local aonde a Igreja se reúne (chamado de "Igreja" por metonímia* -- não por ser Igreja, mas por abrigar a reunião da Igreja) dizendo ser antibíblico alugar, comprar, construir um local adequado a tais reuniões quando a Escritura não afirma isto com clareza. Seria interessante que eles aprendessem o que significa metonímia, e eu posto ao fim do artigo a definição e um link para melhor compreensão.

É inegável que a Igreja cristã começou se reunindo nas casas. Isto é fato, e é bíblico e salutar manter Igrejas nos lares, desde que pastoreadas de conformidade com as prescrições escriturísticas! É a forma mais simples e pura de ser Igreja, e deve ser estimulada. Entretanto, não encontramos nas Escrituras nenhuma prescrição de que não pudessem ser usados locais maiores e mais adequados no caso de uma reunião aonde fosse se reunir um grupo maior de irmãos. No Pentecostes, os 120 irmãos estavam reunidos em um cenáculo, pois provavelmente os mesmos 120 não caberiam em uma casa comum (At 1:15; 2:1). Paulo apóstolo também precisou certa feita de um cenáculo para reunir uma quantidade maior de irmãos (At 20:7-8).

Em alguns locais da Escritura o apóstolo Paulo saúda pessoas e a Igreja que se reúne em suas casas (1 Co 16:19; Cl 4:15; Fm 1:2), o que necessariamente não quer dizer que o pastor da Igreja seja o dono da casa! Entretanto, alguns "desigrejados" saem da Igreja e passam a congregar em sua própria casa, atraindo os irmãos a tais reuniões e se assentando na cadeira do pastor!

Também precisa ser considerado o óbvio: a Igreja Primitiva era uma Igreja CLANDESTINA, e como tal não podia manter espaços próprios para as suas reuniões. Precisou muitas vezes se reunir em locais escondidos e ermos (as catacumbas de Roma, por exemplo) para escapar à perseguição. Como esperar que uma Igreja nestas condições construísse locais de reunião públicas?

Eles falam, então, que a Escritura não prevê claramente a "adaptação" à modernidade, e que o modelo deve permanecer como era no princípio. Mas por que então se utilizam de energia elétrica, bíblias impressas (isto não existia no tempo da Igreja Primitiva), ventiladores e ar condicionado, sistemas de som e instrumentos musicais, móveis e mobílias etc etc, coisas que igualmente não eram usadas na Igreja Primitiva e nem a Escritura ordena ou autoriza que sejam usadas... Por que uma coisa pode, e outra não?? Já vi um (a quem muito considero por sua sabedoria, discrição e coerência, mas que a meu ver deu uma bola fora) defender que na congregação aonde serve não há instrumentos musicais por não ser bíblico, mas há um hinário impresso. Como assim?? Na Igreja Primitiva tinha hinários, impressos em impressoras HP ou Epson?? Ou seriam manuscritos? Em papiro, pergaminho ou papel A4??

É igualmente inegável que as prioridades da Igreja devem ser o cuidado com os pobres, o sustento de missionários etc, e não a construção de obras faraônicas que serão chamadas de “Igrejas” ou “Templos”. Isto deve ser repensado com seriedade, mas não impede que espaços apropriados sejam alugados ou construídos.

Também não entendo estes "ativistas" se levantando contra os “princípios hierárquicos“ da organização humana chamada "igreja". Eles existem, estão muito bem descritos nas Escrituras e não podem ser negados ou abandonados porque alguns ou a maioria os utiliza de forma ilícita e antibíblica! São citados os diáconos (At 6:1-7; 1 Tm 3:8-13), os presbíteros (Tt 1:5; Tg 5:14; 1 Pe 5:1), os pastores ou guias (Hb 13:7, 17; Ef 4:11) e os bispos (At 20:28; F9 1:1; 1 Tm 3:2; Tt 1:7), e fica difícil qualquer opositor negar que tais funções eram reconhecidas desde a Igreja Primitiva, citadas na Escritura inclusive com os apóstolos prescrevendo doutrina para a escolha dos mesmos.

Levantar-se contra a hierarquia porque os homens usam os cargos e funções eclesiásticas para sua própria promoção parece-nos o ato de jogar a água da banheira fora ao fim do banho, e jogar o bebê junto! A hierarquia cristã é bíblica, descrita e doutrinada nas cartas, e não foi instituída para domínio, e sim para serviço e ensino! A hierarquia na Igreja não funciona no sistema de "A manda em B", e sim "A lidera, conduz, pastoreia B”, aonde os líderes trabalham como líderes, e não como mandões.

Quando as Testemunhas de Jeová surgiram no fim do Século XIX, se levantaram contra "toda e qualquer organização" existente na Igreja de sua época, pois a organização na Igreja era coisa do diabo. Entretanto, mais tarde criaram uma organização mais complexa ainda, aonde não há diáconos, presbíteros e bispos (formas bíblicas de liderança), mas há "Classe do Escravo Fiel e Discreto; Corpo Governante; Servo de Zona; Servo de Sucursal; Servo de Distrito; Servo de Circuito; Superintendente ou Ancião da Congregação; Servo Ministerial; Publicador”**. Tornaram a rotura ainda maior!

Jesus ensinando aos seus discípulos sobre o maior dentre eles, não negou que fossem existir "maiores entre os irmãos", mas disse: “Sabeis que os que julgam ser príncipes das gentes, delas se assenhoreiam, e os seus grandes usam de autoridade sobre elas: Mas, entre vós, não será assim; antes, qualquer que entre vós quiser ser grande, será vosso serviçal; E, qualquer que de entre vós quiser ser o primeiro, será servo de todos. Porque o Filho do homem, também, não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate de muitos” (Mc 10:42-45). Não me parece que Ele tenha se levantado contra certos princípios de hierarquia e liderança, mas mostrado que a hierarquia e a liderança dentro da Sua Igreja seriam exercidas em padrões e modelos completamente diferentes. O líder serve, e não é servido!

Parece-me que ao censurar duramente os fariseus por gostarem de ser chamados de Rabi, Jesus não condena chamar alguém de "rabi" ou reconhecer que alguém o seja, mas condena o amor que muitos têm por serem chamados assim e reconhecidos como tal. É evidente que existem pastores que amam, adoram ser chamados por este título (tente chamar alguns de “irmão Fulano”, e eles replicarão imediatamente com impostura de voz: “PASTOR Fulano!”), o que é errado, mas tal erro não nos autoriza a extinguir o ministério pastoral, e sim admoestar e corrigir os que fazem mau uso dele. Parece-me que os que se recusam a chamar pessoas de "mestre e rabi" permanecem chamando seus progenitores de "pai", embora a Escritura prescreva que “a ninguém na terra chameis vosso pai, porque um só é o vosso Pai, o qual está nos céus” (Mt 23:9). Estaria Jesus sendo literal, ou estaria tentando nos ensinar algum princípio?

Como eu já disse, entendo os "desigrejados". Sei que muitos tomaram a difícil decisão de sair da Igreja tradicional com dor no coração, ao ver a congregação que tanto amavam apostatar da fé e inclinar-se ao erro. O que não entendo, e provavelmente nunca irei entender, são os "ativistas" e as suas implicâncias cegas de pessoas revoltadas com o sistema corrupto. O problema não está no sistema, mas nos corruptos que se aproveitam dele! Acreditem: muitos líderes de desigrejados de hoje serão os futuros pastores, bispos e apóstolos das organizações que irão criar no futuro! E muitos retornarão ao vômito, ressuscitando a corrupção que deixaram, vociferando, no passado!

Encerro com uma frase impagável de meu amigo Roberto de Carvalho Forte sobre o tema: “O problema não está em se reunir entre concretos e tijolos mas o de não se reunir sobre o Fundamento: Cristo”.

* METONÍMIA – figura de linguagem que consiste em empregar um termo no lugar de outro, havendo entre ambos estreita afinidade ou relação de sentido.

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